Mio-inositol no hipotireoidismo subclínico
O hipotireoidismo subclínico (HSC) é uma condição que desafia a funcionalidade da tireoide, marcada por níveis elevados de TSH dentro da faixa fisiológica superior, enquanto os níveis de hormônio tireoidiano (HT) permanecem dentro dos limites normais.
Até o momento, o tratamento da HSC continua sendo um tema amplamente debatido na medicina convencional, embora seja uma condição com alto risco de progressão para hipotireoidismo, expondo ainda mais os pacientes afetados a muitos efeitos a longo prazo. Neste contexto, a prática ortomolecular tem explorado o mio-inositol (MYO) como uma intervenção promissora.
A homeostase do MYO é regulada por processos como absorção intestinal e excreção urinária, transporte através de transportadores específicos e síntese endógena. A administração exógena de MYO em doses diárias de 4 a 30 g, por até 12 meses, é geralmente bem tolerada, com efeitos colaterais leves, como náuseas e diarreia, observados apenas em doses superiores a 12 g.
Desequilíbrios no metabolismo do inositol podem afetar a biossíntese, armazenamento e secreção dos hormônios tireoidianos. Os fosfolipídios contendo MYO, como o fosfatidilinositol-4,5-bifosfato (PIP2), atuam como precursores de intermediários moleculares chave na transdução de sinal, participando de cascatas hormonais, como a regulada pelo hormônio estimulador da tireoide (TSH). Além disso, o MYO regula a iodação mediada por H2O2 nos tireócitos, facilitando a geração de H2O2, uma etapa crucial para a organização do iodo e a síntese do hormônio tireoidiano.
Como resultado, a depleção de MYO ou a alteração na via de sinalização do TSH dependente do inositol pode aumentar a suscetibilidade ao desenvolvimento de hipotireoidismo. A prática ortomolecular, que dá especial atenção a esses processos, propõe que a suplementação de MYO poderia desempenhar um papel crucial na regulação da função tiroideia, especialmente no contexto do hipotiroidismo subclínico.
Em um estudo com quarenta e oito participantes, com TSH entre 4,01 e 9,99 mUI/L e com TPOAb e TgAb positivos, eles foram divididos aleatoriamente em dois grupos iguais e tratados com 600 mg de MYO mais 83 μg de selênio (MYO+Se) ou apenas 83 μg de selênio (Se) por 6 meses. Os resultados mostraram melhorias significativas nos parâmetros da tireoide no grupo MYO+Se no final do estudo: uma diminuição de 31% no TSH (4,4 ± 0,9 vs. 3,1 ± 0,6 mUI/mL), uma diminuição de 44% no TPOAb e um 48% de diminuição em TgAb (p<0,01 para cada parâmetro).
Em outro ensaio clínico com 86 pacientes com hipotireoidismo subclínico e hipotireoidismo autoimune, tratados com 600 mg de MYO e 83 µg de selênio por 6 meses, foi observada melhora significativa nos níveis de TSH (3,12 ± 0,09 mUI/L vs. 4,32 ± 0,06 mUI /L no início do estudo; p ≤ 0,001). Além disso, esses pacientes relataram uma melhora significativa na qualidade de vida, avaliada por um teste de sintomatologia subjetiva.
Outro estudo recente com 168 pacientes com hipotireoidismo autoimune e níveis de TSH entre 3 e 6 mUI/mL, divididos em dois grupos e tratados com MYO+Se (600 mg + 83 µg, respectivamente) ou Se sozinho (83 µg), revelou uma significativa melhora nos parâmetros tireoidianos (TSH, fT4, TPOAb, TgAb) apenas no grupo MYO+Se.
Além de melhorar os níveis de TSH (indicativo de melhor síntese do hormônio tireoidiano pelos tirócitos), o MYO também melhora os níveis de anticorpos tireoidianos, indicando melhorias no processo autoimune. Investigações metabolômicas confirmaram esta evidência, apontando que a demanda por MYO é maior em pacientes com hipotireoidismo do que em indivíduos saudáveis.
Em resumo, o mio-inositol desempenha um papel crucial na fisiologia da tireoide, regulando a iodação e aumentando a sensibilidade dos tireócitos ao TSH. Estudos clínicos apoiam o potencial terapêutico do MYO, especialmente quando combinado com selênio, na melhoria da função tireoidiana e da qualidade de vida em pacientes com hipotireoidismo subclínico e autoimune.
Referência: Pace C, Tumino D, Russo M, Le Moli R, Naselli A, Borzì G, Malandrino P, Frasca F. Papel da suplementação de selênio e mio-inositol na progressão da tireoidite autoimune. Endocr J. 2020 Nov 28;67(11):1093-1098. doi: 10.1507/endocrj.EJ20-0062. Publicado online em 2020 Jul 15. PMID: 32669509.